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Brasileiros são bons de guerra, sim! Há 76 anos, a FEB entrava em combate na Segunda Guerra Mundial

Por History Channel Brasil em 15 de Setembro de 2020 às 11:29 HS
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A Força Expedicionária Brasileira (FEB) entrou em combate na Europa pela primeira em 15 de setembro de 1944.  Naquele dia, os soldados brasileiros começaram a atuar na Itália, em conjunto com regimentos dos Estados Unidos, ajudando a liberar o Vale do rio Serchio da ocupação nazista. A partir daí, a FEB permaneceu em combate ininterruptamente durante duzentos e trinta e nove dias.

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"O primeiro escalão da Força Expedicionária Brasileira, com cerca de 5 mil e oitocentos homens, embarcou no porto do Rio de Janeiro no navio transporte americano General Mann, que levantou âncora na noite do dia 2 de julho. Pela primeira vez na História, uma força militar sul-americana  zarpou para combater em plena Europa", conta João Barone, que além de ser baterista dos Paralamas do Sucesso é um dos maiores especialistas sobre a participação do Brasil no conflito.  

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Barone explica que a chegada dos soldados brasileiros no front italiano ocorreu em 16 de julho de julho de 1944. Eram na sua maioria homens do 6º Regimento de Infantaria, o Ipiranga, treinados em Caçapava, São Paulo. Depois de superarem as dificuldades de formação e treinamento no Brasil, ainda passariam por uma fase de adaptação na chegada ao chamado teatro de operações de guerra, sob observação de militares dos EUA, até que se demonstrassem preparados para entrar em ação. 

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General Mark Clark inspeciona soldados da FEB. Itália, 30 de novembro de 1944

No dia 18 de agosto de 44, a FEB foi declarada apta para combate, sendo integrada ao V Exército dos Estados Unidos, numa cerimônia ocorrida no acampamento em Tarquínia. No dia seguinte, o próprio primeiro ministro inglês Winston Churchill visitou as tropas e passou em revista o contingente brasileiro. A partir de setembro, os pracinhas começaram a lutar ao lado dos soldados dos EUA, na região mais à oeste do território italiano, enquanto o lendário VIII Exército britânico subia pelo litoral leste.

A chegada dos brasileiros ajudou a completar as lacunas formadas com a saída de contingentes franceses e dos EUA para a invasão do sul da França. Ainda em setembro, chegariam mais dois escalões da FEB ao front italiano, compostos pelo 1º Regimento de Infantaria, o Sampaio (RJ), e o 11º, O Tiradentes (MG). Em fevereiro de 1945, o 4º e 5º escalões chegariam para tomar parte nas últimas rodadas do conflito, totalizando mais de 25 mil homens. Eram brasileiros provenientes de todas as partes do país, com média de idade ao redor dos 20 anos, universitários, profissionais liberais, camponeses, de todas as origens sociais. Mas, em sua maioria, jovens humildes, uma boa parcela nem sabia ler ou escrever direito. 

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General Mascarenhas cumprimenta o General dos EUA Lucian Truscott, na Itália, em 11 de dezembro de 1944

O General João Batista Mascarenhas de Morais estava subordinado ao IV Corpo dos EUA, comandado pelo general Willis Crittemberger. A FEB foi adquirindo experiência de combate ao longo dos meses em ação. Havia a meta de atingir a importante cidade de Bolonha antes do inverno, mas que não foi alcançada. Os brasileiros tentaram por várias vezes tomar o famigerado Monte Castello, desde novembro de 44, sendo que apenas em 21 de fevereiro, depois de quatro investidas, é que  conseguiram conquistá-lo. 

Os brasileiros libertaram várias localidades italianas e ajudaram a romper a famosa Linha gótica, o eficiente sistema de defesa montado pelos alemães. As tropas alemãs eram experientes, com anos de combate, vindas da frente russa, sabiam lutar muito bem. Os morteiros “tedescos” (como os pracinhas chamavam o inimigo alemão) e a mortífera metralhadora MG42, apelidada de Lurdinha pelos brasileiros, fizeram tombar muitos de nossos soldados. Com a  Ofensiva da Primavera, os brasileiros foram incumbidos de tomar a cidade de Montese, liberando o avanço sobre a planície do rio Pó, região onde a FEB cercou e rendeu a 148a Divisão de infantaria alemã, última grande ação dos nossos pracinhas. A guerra chegava ao fim.

Ao todo, a divisão brasileira lutou contra nove divisões alemãs e três italianas. Morreram 450 praças, 13 oficiais e 8 pilotos brasileiros durante a guerra. Além disso, houve aproximadamente 12 mil feridos nos combates.

Lembranças de um pracinha

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Muitas histórias envolvendo as tropas da FEB ainda não foram contadas e outras tantas estão no esquecimento sobre a participação dos brasileiros na Segunda Guerra Mundial. O HISTORY, num esforço de lembrar os atos de coragem destes homens que defenderam o Brasil, traz a história do soldado Fernando Dantas D’Ávila, que trabalhou na Itália até 1945 como mensageiro do exército brasileiro e, ferido, estava no hospital quando a Guerra chegou ao fim.

Seu filho, também chamado Fernando, nos forneceu um precioso material histórico, com fotos, documentos, cartas de seu pai e também uma emocionante história: o pracinha Fernando teve que enfrentar inimigos e fogo cerrado para levar uma importante mensagem… foram os 600 metros mais longos que ele já havia percorrido na vida até então:

“Como já disse, meu pai era mensageiro, e, em um momento especialmente difícil de combate, ele foi encarregado de levar uma mensagem a um posto avançado que se localizava a uns 600 metros do comando e vivia sob constante fustigação inimiga. As linhas de comunicação haviam sido rompidas (eram físicas). A mensagem que ele nunca esqueceu dizia: "1143 cia iniciará fogos previstos".

Havia fogo cerrado, e a dificuldade de progressão era tanta, que ele levou quase uma hora para conseguir alcançar o objetivo, mesmo apressado pela proximidade do início do fogo amigo. Quando chegou ao posto e entregou a mensagem, o sargento lhe disse;

"Obrigado, mas as comunicações já foram restabelecidas...".

"O que o Pracinha Fernando deve ter pensado nesse momento?

Isso ele nunca me falou..."

Ao todo, 25 mil brasileiros foram enviados para a Segunda Guerra, com a missão completar as lacunas deixadas pelo deslocamento de americanos e franceses destacados à invasão do sul da França. Ao final da luta, os brasileiros haviam libertado várias localidades italianas após desbancar o eficiente sistema de defesa dos alemães.

Quando o confronto acabou, o Pracinha Fernando escreveu uma emotiva carta à família, direto da Itália, datada em 3 de maio de 1945.

“Nem sei como começar esta. A alegria que me invade a alma é tal que não tenho palavras para descrevê-la. Até que enfim isto terminou.”

A carta continha três páginas, em papel da American Red Cross. No final, o bravo soldado, revelou um desejo á família, assim que colocasse os pés novamente no Brasil: “Depois iremos para a casa e comerei uma feijoada, tal que espero ficar sem levantar-me durante três horas após a mesma, tempo este que aproveitarei para contar-lhes passagens da guerra.”

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Veja abaixo mais algumas preciosidades enviadas pelo filho do Pracinha Fernando:

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Revisitando os passos da FEB

Em 2015, durante o programa O Caminho dos Heróis, exibido pelo HISTORY, João Barone, junto com outros entusiastas da Força Expedicionária Brasileira, revisitou os lugares onde aconteceram as batalhas mais emblemáticas travadas pela FEB. Confira abaixo o depoimento dele:

"Comprovamos como os alemães estavam em vantagem estratégica dominando o topo dos morros, foi tudo muito emocionante. Mas as maiores emoções afloraram ao constatar como o povo local demonstra um carinho especial aos brasileiros, seja nos inúmeros marcos e monumentos erguidos em homenagem aos pracinhas ao redor da região, ou quando narravam as histórias  dos tempos difíceis da guerra, nas quais os brasileiros escreveram uma página humanitária única, ao ajudar aquele sofrido povo que não tinha o que comer e sofria as agruras do inverno. Nosso grupo recebeu diversas homenagens durante a jornada".

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"Onde quer que chegássemos, a prefeitura local fazia uma cerimônia em honra aos brasileiros. Também pontuamos nossa jornada com algo inédito: pela primeira vez, fizemos a leitura solene dos nomes dos soldados que tombaram nos locais onde combateram: os aviadores da FAB em Livergnano, os muitos pracinhas que deram seu sangue em Monte Castello, Montese e Fornovo/Collecchio".


 

Imagens: History/Arquivo, Arquivo Nacional, via Wikimedia Commons, Arquivo familiar de Fernando Dantas D’Ávila, Blog do Chico Miranda e The National WWII Museum